Impactos da reforma tributária no Simples Nacional
Na série de artigos que a Múltipla Consultoria e a MSA Advogados estão preparando para os seus clientes sobre a regulamentação da reforma tributária (Lei Complementar 214/2025), o assunto tratado hoje será o Simples Nacional.
Embora a reforma não vá alterar as alíquotas do Simples Nacional, diversas alterações impactarão as empresas optantes pelo regime simplificado, algumas delas influenciando diretamente os preços praticados e os custos dos seus insumos.
Impactos indiretos
Alguns efeitos da reforma serão reflexos, ou seja, não estão diretamente relacionados ao Simples Nacional, mas as empresas optantes sofrerão porque quem com elas se relaciona sofrerá.
As duas situações de maior relevância serão o preço dos insumos e o valor dos aluguéis.
A tributação geral sobre serviços será fortemente majorada com o IBS e a CBS, o que vai refletir nos preços, por óbvio. Por outro lado, quando se trata de fornecimento de bens, alguns setores sofrerão um aumento de tributos, enquanto outros uma redução, sobretudo a indústria. Diante disso, pode ocorrer uma variação de preços nos bens e serviços (mercadorias, matéria prima e insumos) que as empresas optantes pelo Simples Nacional adquirem no mercado para a realização de suas atividades.
Em relação aos aluguéis, a reforma tributária vai penalizá-los. Hoje não incide ICMS, IPI ou ISS sobre a renda de locação, e com a reforma passa a incidir IBS e CBS sobre tais rendimentos. O resultado, de novo, vai ser refletido no valor final dos aluguéis: tendem a subir para compensar a maior tributação do locador.
Impactos diretos
Passamos agora a tratar das mudanças que afetam diretamente as empresas optantes pelo regime simplificado.
O Art. 41, §2° da LC 214/2025 estabelece que os contribuintes optantes pelo Simples Nacional ou pelo MEI continuam sujeitos às regras desses regimes. Significa dizer que a tributação não sofrerá alteração de alíquota ou no regime apuração, pelo menos, não de forma relevante.
Contudo, o §3° do mesmo artigo prevê que os optantes pelo Simples Nacional poderão exercer a opção de apurar e recolher o IBS e a CBS pelo regime regular, hipótese na qual o IBS e a CBS serão apurados e recolhidos conforme o disposto como se o contribuinte não fosse optante pelo regime simplificado.
Em outras palavras, em regra, a implementação do IBS e CBS não muda as alíquotas do Simples Nacional, e a arrecadação desses tributos estará coberta pela alíquota simplificada paga pelas ME e EPP optantes. Contudo, é possível ao optante manter o Simples Nacional para os demais tributos, e recolher somente o IBS e a CBS fora do regime.
A justificativa para tal opção é a possibilidade de conceder crédito desses tributos para os seus clientes, e aqui temos o primeiro impacto relevante.
O Art. 47, §9°, da LC 214/2025 prevê que empresas do Simples Nacional não poderão se apropriar de créditos de IBS e CBS, bem como, nas operações em que estas forem fornecedores de bens e serviços, o crédito gerado na operação ficará limitado ao valor equivalente desses tributos no regime simplificado. É o que já ocorre hoje com o ICMS, agora estendido ao IBS e à CBS.
E assim como acontece com o ICMS, a falta de concessão de crédito nas vendas tira a competitividade da empresa optante pelo Simples Nacional. As empresas optantes hoje dão o crédito de ICMS limitado à parcela desse tributo paga na alíquota do regime simplificado, contudo, geram crédito integral de PIS e COFINS para seus clientes. Com a reforma, saem ICMS, PIS e COFINS, entram IBS e CBS, e a empresa optante deixa de dar crédito sobre todos esses tributos – ou melhor, concede o crédito limitado à parcela desses tributos na alíquota do Simples.
Para aqueles que não quiserem tal limitação, a opção é recolher IBS e CBS fora do Simples Nacional – daí a opção da lei.
Essa falta de competitividade vai impactar mais as empresas que realizam as chamadas operações B2B, ou seja, para outras empresas contribuintes. Aquelas que realizam operações para consumidores finais não serão impactadas.
A reforma cria o imposto seletivo (IS), o qual incidirá sobre bens e serviços supostamente nocivos à saúde e ao meio ambiente. Desse, a empresa optante pelo regime simplificado não vai escapar. A lei cria o inciso XIV-A no artigo 13 da LC 123/2006, para incluir o IS como tributo a ser pago fora do Simples Nacional.
Outras mudanças na Lei do Simples Nacional
Alteração a partir de maio/2025:
A LC 214/2025 altera ainda o artigo 3° da LC 123/2006 para incluir no conceito de receita bruta das empresas, além da venda de bens e serviços, quaisquer outras receitas da atividade econômica exercida pelo contribuinte. Com isso, a base de cálculo do tributo, assim como o teto para opção pelo regime podem ficar majorado, dependendo das receitas da empresa.
Alterações a partir de 01/01/2027:
A partir de 2027, passa a ser possível optar por recolher CBS e IBS fora do regime simplificado. Essa opção poderá se dar em duas oportunidades no ano, em janeiro e julho.
Além disso, altera o prazo para opção pelo Simples Nacional: passa do último dia de janeiro de cada ano, para o último dia de setembro de cada ano (alteração no art. 16, §2° da LC 123/2006).
Outras mudanças relevantes:
A receita bruta dos últimos 12 meses (RBT12), utilizada para apuração da alíquota a ser paga pelo contribuinte no regime simplificado, que hoje refere-se aos 12 meses anteriores ao período de apuração, passa a ser aquela auferida nos 12 meses anteriores ao mês anterior ao período da apuração. Ou seja, os 12 meses passarão a ser apurados um mês antes do que se faz hoje (alteração no artigo 18, §1° e §1°-A da LC 123/2006).
Foi alterado ainda o §4° do artigo 18 da LC 123/2006, e com isso, a receita de produtos industrializados sem incidência de IPI serão tributadas no anexo I, e não mais no anexo II, ou seja, com alíquota 0,5% inferior. Essa mudança é boa, pois nem todo produto industrializado sofre incidência de IPI.
Aumento de burocracia: a declaração anual entregue hoje pelos optantes passa a ser mensal (alteração no artigo 25 da LC 123/2006). Por outro lado, há a previsão de criação da chamada “declaração assistida”, na qual o contribuinte recebe uma espécie de declaração pré-preenchida, bastando concordar com os dados indicados.
O MEI passa a ter que emitir nota fiscal para qualquer venda, não mais apenas para CNPJ.
Os anexos da LC 123/2006 (as tabelas de apuração) sofrem alteração apenas nos anos de 2027 a 2028 para aqueles que recolhem na 6ª e última faixa. Nesses anos, essas empresas recolhem 0,1% de CBS em separado, e o percentual dessa faixa fica reduzido em 0,1%. Nos anos seguintes, seguem idênticos aos percentuais atuais. Isso ocorre porque na 6ª faixa o recolhimento de ICMS, ISS, IBS e CBS se dá fora da alíquota simplificada.
Em resumo, os impactos são pequenos se comparados com as empresas tributadas por outros regimes, mas não são desprezíveis, e começam a gerar efeitos em 2027.