A evolução da gestão patrimonial no Brasil
Ao longo de décadas os bancos nadaram de braçada, custodiando basicamente toda a riqueza da população. Obviamente em um mercado com pouca concorrência, em uma “arquitetura fechada”, ofereciam opções de investimentos caras e com rentabilidade reduzida para os clientes. Os investidores com poucas opções, influenciados pelo viés do Status Quo, aceitavam quase cegamente as orientações do gerente (muitos ainda nesta situação), uma pessoa geralmente honesta, mas que não tinha (tem) como se desvincular de suas metas e sistemas de comissão e remuneração ao fazer as recomendações de investimentos, recomendações estas que nem sempre estarão alinhados aos interesses do investidor.
Os bancos se beneficiavam desta “arquitetura fechada”, que nada mais é do que a distribuição de produtos financeiros onde uma mesma instituição atua tanto como emissor quanto como distribuidor do produto. A relação comercial já estabelecida com correntistas era um canal muito eficiente para distribuir produtos de emissão própria, fossem estes CDBs, LCIs, LCAs, Fundos de investimento ou planos de previdência, ganhando nas duas pontas.
O surgimento das corretoras
Esta realidade começou a mudar nos últimos anos com o boom das corretoras, que surfaram na onda da rejeição aos bancos tradicionais, operando no modelo de negocio de “arquitetura aberta”, muitas vezes chamado de “shopping de investimentos”. Para ganhar mercado dos bancos, adotaram estratégias comerciais agressivas, utilizando uma rede de representantes oriunda do próprio setor bancário, oferecendo uma plataforma de investimento digital muitíssimo melhor do que a dos bancos, plataformas estas que proporcionam uma maior transparência e independência para o investidor.
As corretoras têm como base para expansão dos seus negócios os agentes autônomos de investimentos, os AAI, também conhecidos como assessores de investimentos, remunerados como vendedores, ou seja, por comissão. Estes profissionais não estão autorizados a fazer qualquer recomendação de investimentos, apenas oferecer e explicar as características dos investimentos para o investidor. Na prática não é isto que acontece!
O modelo transacional e o inevitável conflito de interesses
No aspecto gestão de patrimônio, o modelo de negócio adotado por todos os bancos comerciais, plataformas de Agentes Autônomos de Investimentos e corretoras é o chamado modelo transacional. A relação neste modelo é a de venda, sendo inevitável que entre o vendedor e comprador exista um ruído transacional, um conflito de interesses entre as partes.
Enfim, gerentes de bancos, obviamente, defendem em primeiro lugar o interesse do banco, e que nem sempre estarão alinhados aos seus interesses, além de estarem inseridos em um amplo sistema de comissões e remunerações, metas, produto do mês, etc. Assessores de investimentos tem a remuneração (comissão) atrelada ao tipo de produto ofertado e recebem comissões dos fornecedores de produtos financeiros, como gestoras de fundos e bancos. Toda vez que um cliente aplica dinheiro em um fundo de investimentos, por exemplo, o gestor de recursos responsável por esse produto paga uma comissão à instituição financeira que viabilizou a venda. Isso é feito através de um percentual da taxa de administração desse fundo (apelidado de rebate).
Na próxima matéria iremos apresentar um novo modelo que começa a se consolidar no Brasil.
Veja todos os artigos da série:
- Surgimento do modelo fiduciário para o pequeno investidor
- O conflito de interesses e a estrutura do comissionamento
- O conflito de interesse e a preocupação da CVM e de reguladores em outros mercados
- Consultor de investimento pago – algumas considerações
O presente artigo reflete unicamente as opiniões do autor.