O conflito de interesses e a estrutura do comissionamento
Cada produto financeiro possui uma remuneração para quem distribui e o rebate é a comissão que uma gestora paga para quem vende um fundo de investimento, geralmente os assessores de corretoras, por exemplo.
Por mais que o pagamento de rebates seja comum e recorrente no mercado Brasileiro, e não seja necessariamente uma prática condenável, a forma como ele é negociado atualmente pelos bancos e plataformas acaba dando margem para muitos conflitos de interesse.
Ocorre o mesmo que em qualquer mercado onde existe a figura do distribuidor, e não é diferente no mercado financeiro. Bancos e corretoras cobram rebates maiores de fundos “mais difíceis de vender”. Fundos tradicionais com rentabilidade histórica consistente conseguem negociar rebates menores, pois o que é “fácil de vender” pode se dar ao luxo de não pagar tão bem para quem “só” faz o esforço de venda. Alguns fundos muito mais famosos, inclusive, não pagam nada de rebate para ninguém. Você se lembra de algum fundo que fica fechado na maior parte do tempo, com janela de aporte muito pequena quando abrem, os que os Bancos e Corretoras usam para fazer pirotecnia com muita divulgação e no final pouquíssimos investidores conseguem entrar?
Infelizmente, esta forma de negociação do rebate desalinha a plataforma e o cliente. Bancos e corretoras (e os gerentes e eventuais agentes autônomos que ela contrata) ficam incentivados a vender os fundos que pagam mais rebates, mesmo que apresentem mais riscos ou sejam comprovadamente (ou provavelmente) piores que outros que as plataformas tem disponíveis, mas pagam menos.
O rebate é apenas um dos problemas de conflito de interesse no modelo transacional.
É obvio que para a instituição financeira é muito mais rentável ofertar um produto da casa, onde se ganha nas duas pontas, como emissor e como distribuidor.
E a utilização do efeito do enquadramento, que se refere ao fato que a escolha é influenciada pela forma como o problema é expresso? Você já ouviu falar daquele investimento com capital garantido que paga na pior das hipóteses o valor investido? Bancos e corretoras se esqueceram do valor do dinheiro no tempo? Só como exemplo, para uma inflação de 4,5% ao ano, um investimento destes com prazo de 5 anos pode gerar uma perda para inflação de 19,75%.
E as operações de renda fixa com opções, onde o agente apresenta a rentabilidade bruta esperada sem chamar atenção para o fato que o custo da operação, realizada exclusivamente pela mesa de operação, com a cobrança de um percentual sobre o valor da operação, reduz significativamente a rentabilidade?
Na próxima matéria falaremos do reconhecimento formal da CVM sobre este problema de conflito de interesses.
Veja todos os artigos da série:
- A evolução da gestão patrimonial no Brasil
- Surgimento do modelo fiduciário para o pequeno investidor
- O conflito de interesse e a preocupação da CVM e de reguladores em outros mercados
- Consultor de investimento pago – algumas considerações
O presente artigo reflete unicamente as opiniões do autor.